Convenhamos, o Spotify é uma mão na roda como poucas aplicações são.

Como músico e fã de música, é incrível ter acesso aos meus discos preferidos em qualquer lugar, a qualquer hora.

Mas como toda ideia de negócio disruptiva, o Spotify encarou desafios, críticas, “tretas” e também encontrou oportunidades.

Não, eu não estou aqui para te ajudar a criar um copycat dele.

A verdade é que a jornada do Spotify pode nos ensinar muitas coisas sobre como encontrar, explorar (no bom sentido da palavra) e solidificar nossas startups em um mercado.

Vamos ver aonde isso vai dar? Acompanhe. 🙂

O mercado do Spotify

Fundado em 2008, na Suécia, a premissa do serviço é muito simples: democratizar o acesso à música.

Pretty clear. 😉

Ao longo de 9 anos, o Spotify recebeu cerca de 2 bilhões de dólares em investimentos (fonte: TechCrunch)e provavelmente iniciará um IPO em 2018.

Em Fevereiro de 2010 o Founders Fund investiu cerca de 11.6 milhões de euros (~$16 mi) na Series C — provavelmente o investimento mais importante recebido pela empresa até aquele momento. O Spotify já havia recebido pouco mais de $70 milhões nas rodadas A e B.

O porque disso é muito simples: o investimento foi feito para que Sean Parker, co-fundador do Napster, ajudasse a empresa a superar as principais gravadoras no maior mercado de música do mundo (se você pensou no norte-americano, acertou).

Parker foi o responsável por negociar diretamente com a Warner Music e a Universal Music, e em 2011 o Spotify adentrava o mercado dos EUA. Esse foi o primeiro passo para a empresa alcançar 140 milhões de usuários ativos e 50 milhões de subscribers em Março de 2017. Um freemium e tanto, hein?

Fonte: Music Business Worldwide

Só de curiosidade, o Spotify Premium custa $9.99/mês.

(9,99 * 50 milhões) * 12 = $5.994.000.000,00 ARR (pre-tax e sem considerar o repasse para os artistas).

Segundo a Statista, a receita do mercado global de música gira em torno de $47.5 bilhões.

A loooooot of zeros 😛

De forma simplificada, o Spotify tem cerca de 7,9% da receita mundial do mercado. That’s a lot.

Só os EUA tem um mercado avaliado em pouco mais de $5 bilhões (em 2016). E 70% dele é composto por plays digitais.

Fonte: Wikipédia

Adivinha?

Temos um deles. 😛

A love & hate relationship

Agora que nós já entendemos o mercado, eu quero ressaltar um ponto importante.

O Spotify não foi amado desde o day 1.

Nós precisamos lembrar que na época o mercado da música ainda era bem rico. Mesmo com sinais de que os orçamentos iriam ser reduzidos e os contratos migrariam para formatos mais abusivos, corporações não iam deixar o mercado ser tomado fácil assim.

Uma série bem legal sobre o mercado da música é a Vinyl, da HBO.

O Airbnb não conseguiu uma lista enorme de opções de hospedagem logo de cara. O Easy Taxi não se tornou o app mais usado para pegar um táxi da noite para o dia.

Grandes ideias enfrentam grandes desafios. E muito blowback.

Como o mercado estava na época

O desenvolvimento da tecnologia trazia novidades a cada instante. O primeiro iPod foi lançado em 2001, o Napster foi lançado em 1999 e apenas 3 anos depois chegou ao seu “fim” (um processo judicial impedia o compartilhamento de qualquer arquivo sem a permissão das gravadoras).

Mas ainda existiam várias outras plataformas de compartilhamento P2P (peer-to-peer) ativas.

Uma mudança estava acontecendo.

Os anos entre 2000 e 2010 foram decisivos para essa isto.

Cada vez mais consumidores de música se afastavam dos discos físicos (vinyl e CD) e se aproximavam dos formatos digitais (mp3 e streaming).

Diego Gomes, aqui do SaaSholic, compartilhou um texto bem legal sobre A Era do Conteúdo. Nele, o D. fala sobre a subscription economy, um termo criado e difundido pela Zuora (uma plataforma de cobrança recorrente).

Essa forma de economia mostra que as pessoas não querem ter coisas, elas querem apenas usar e pagar conforme usam. A ideia parece familiar?

O timing não podia ser melhor.

Uma nova geração começava a consumir música, mas não queria precisar andar com dezenas de discos na mochila. Muito menos fitas cassetes!

A nostalgia dos discos atingia outra geração. E mesmo ela entende como formatos dinâmicos e portáteis se adequam melhor ao dia a dia moderno.

Ok, e daí?

Tudo o que eu falei até agora tem um objetivo simples: contextualização.

O Spotify não é o Spotify porque recebeu $2 bi em investimentos. Ele é a referência no mercado porque encontrou um problema, descobriu o que o mercado precisava e propôs uma solução disruptiva.

Não importa se rockstars e celebridades afirmam que “a música está morrendo”. O mercado continua gerando receita, mas com modelos de negócio diferentes.

E o mesmo acontece no seu mercado de atuação, esteja ele “morrendo” ou não.

Entendendo o modelo de negócio do Spotify

Claramente uma boa ideia de negócio encontra uma boa solução para uma falha no fornecimento de um serviço.

Porém, nada disso adianta se a própria startup não for sexy.

O Spotify é extremamente sexy. Mas umbelo corpo não é nada sem o cérebro para saber o que fazer com ele.

Juntando os dois, encontramos o modelo de negócio ideal.

Plataforma SaaS

subscription economy que falamos anteriormente tem um pé exatamente aqui. Imagine se você precisasse comprar uma nova versão do Spotify e fazer uma nova instalação sempre que uma atualização fosse feita?

Impossível.

Como uma plataforma SaaS o Spotify utiliza a nuvem para escalar a distribuição do seu serviço. Dessa forma é possível integrar os diferentes dispositivos dos usuários e melhorar a plataforma com atualizações constantes feitas pela nuvem. Além de facilitar o acesso ao catálogo de músicas.

E a melhor forma de cobrar por isso é através de assinatura recorrente. O investimento mensal do usuário é baixo, mas o valor do serviço é muito alto.

SaaS Enabled Marketplace

O fênomeno do SaaS Enabled Marketplace é real e veio para ficar. O SEM reúne dois mundos: softwares na nuvem (SaaS) e plataformas que conectam compradores e vendedores (Marketplaces).

Etsy e o Mercado Livre são exemplos de SaaS Enabled Marketplaces. A loja online oferece o produto de diversos vendedores e um percentual das vendas é repassado para a loja.

Em troca, os vendedores possuem facilidades de divulgação dos seus produtos e um dashboard para acompanhar as vendas e anúncios.

O Spotify conecta artistas aos seus fãs através da plataforma online. Mas sabe qual é a melhor parte? Ele também não é o intermediário.

O Spotify faz o repasse da arrecadação do artista para o que eles chamam de “agregadores”. Eles podem ser empresas focadas em distribuição de música (como a ONErpm) ou uma gravadora que gerencia seus artistas.

No longo prazo, o Spotify lida com menos burocracia do que outros SEM’s.

Isto dá mais tempo para investir na captação de usuários e relacionamento com os artistas, selos, gravadoras e agregadores.

Trial

O Freemium é um modelo famoso. Muitas startups SaaS optam por esse formato logo de cara, mas outras também transitam para ele depois.

Em uma plataforma SaaS que adota este modelo, o mais comum é disponibilizar uma versão gratuita do serviço em paralelo com a paga. Exatamente como o Spotify faz.

No plano gratuito, você pode ouvir músicas de forma ilimitada, mas de tempos em tempos é preciso aguentar um pequeno comercial. Além disso, existe um número máximo de vezes que você pode pular músicas, não é possível fazer o streaming em alta resolução, ou salvar suas faixas preferidas offline.

Esses roadblocks atuam diretamente na maneira como os usuários consomem música.

Imagine colocar o Spotify para rodar em uma festa e ter que aguentar propagandas entre as músicas?

Ou então não poder pular algumas faixas do álbum que está tocando até a faixa mais animada?

Ou não conseguir salvar suas músicas preferidas offline para ouvir enquanto estiver viajando de avião ou sem internet?

Assinar o plano premium vira um no-brainer.

Como ser o próximo Spotify?

O Spotify virou quase um commodity.

Ninguém fala “vou colocar minhas músicas em plataformas de streaming”. O que você ouve é “vou coloca minhas músicas no Spotify”.

Mesmo que isso signifique disponibilizá-las em diversos outros serviços também.

Ao longo desse texto, meu objetivo não foi destrinchar o Spotify apenas por ser disruptivo e inovador. Mas também encontrar os pontos em comum com outras empresas e os mindsets que você pode adotar na sua própria startup para ser “o próximo Spotify” do seu mercado.

Vou explicar o que isso significa.

O mercado

Uma pesquisa rápida em threads do Quora e você vai encontrar diferentes respostas para o “tamando de mercado ideal” para investidores.

Sequoia Capital é famosa por ajudar startups a encontrarem números bons para seus pitches.

Um unicórnio nasce de mercados que são muito grandes. Muito mesmo. Obviamente isso vai envolver expandir internacionalmente, lidar com diversos mercados menores com suas próprias regulamentações, impostos e necessidades.

Mas também não impede que você encontre um mercado grande sem sair de casa. Imagine criar uma startup que atue no transporte rodoviário de cargas somente no Brasil? Ou facilitar a produção de soja? Ou melhorar a organização do transporte público?

Você precisa encontrar um mercado que seja grande o suficiente para você criar uma empresa lucrativa, mas que não seja tão pequeno que depois de um período curto de tempo, você não terá para onde crescer.

Esse é um dos grandes motivos que várias empresas pivotam ao longo do caminho.

A disruptividade

Uma boa ideia sempre vai ser uma boa ideia. Mas uma ideia disruptiva vai despertar reações que você não vai imaginar.

Se alguém não gostou da sua ideia e falou que ela não vai funcionar, não se preocupe. Isso não significa que ela não é boa e não pode ser desenvolvida. As soluções mais incomuns costumam ser as melhores, e os feedbacks negativos são os mais valiosos.

O Spotify abraçou o streaming quando o mercado ainda lutava para emplacar um formato físico de mídia. O Airbnb começou alugando sofás e passou para quartos e apartamentos, quando a bolha econômica tornava a estadia em hotéis quase impossível. Uber quebrou a hegemonia dos taxistas oferecendo corridas através de carros “civis”.

Se o seu mercado é grande o suficiente e tem um problema claro, as ideias mais disruptivas vão atrair investidores, clientes e times dispostos a encarar o desafio de escalar o negócio.

O formato

Freemium, trial, cobrança mensal, anual, única. Plataforma SaaS, app, marketplace. Cada público tem uma característica própria e o formato (ou modelo) da sua startup precisa ser lapidado para ele.

Se a sua ideia roda muito melhor em uma plataforma web, mas seus usuários passam 90% do tempo no mobile, gastar 3 meses codando essa plataforma para ninguém vai usar é uma perda de tempo sem fim.

Encontre o meio termo, descubra o que sua audiência quer usar e lapide o formato. BTW, testar é parte do processo e você deve fazer muitos testes!

O preço

Precificar um produto é um trabalho em constante desenvolvimento. Toda startup já passou por períodos de mudança em seus preços. Seja pela melhoria do serviço ou reajuste de custos, uma hora você vai precisar fazer isso.

Bons preços são aqueles que permitem à startup gerar receita anual suficiente para manter o negócio rodando (bootstrapped) ou chegar em um bom valuation (para atrair investidores sem ser loucamente diluído). Ao mesmo tempo que são acessíveis para os clientes e passam o valor desejado do serviço.

Você não pode cobrar $9,99/mês por uma plataforma de analytics corporativa robusta. Ninguém vai acreditar no seu produto porque, pelo preço, nem você acredita!

Mas também não é possível cobrar $100,00/mês por uma ferramenta que gerencia e organiza os seus feeds RSS.

PS: um texto muito legal no Hackernoon que fala sobre como testar preços em SaaS.

A comunidade

Lembro uma vez que validei uma ideia com o Diego e ele me falou algo muito importante: “as pessoas sempre querem participar de algo, elas querem ser ativas dentro de uma comunidade”.

Provavelmente isso justifica o sucesso do Quora, Slack e do próprio Spotify.

Dentro do Quora várias pessoas interagem sobre diversos tópicos, emitem suas opiniões, aprendem e se conhecem.

No Spotify, é possível ver o que seus amigos estão ouvindo, criar playlists compartilhadas, enviar músicas para amigos e compartilhar suas canções preferidas em outras mídias sociais.

Uma comunidade se cria em torno de um serviço e os usuários deixam de ser apenas usuários. Com o tempo, eles se tornam defensores, da marca, da experiência e do produto. Esse é o caminho claro para o sucesso.

UX e Dev

Ninguém espera que o MVP de uma ideia dê uma aula de usabilidade. Mas para sair da garagem e partir pro mundo real, UX e development são indispensáveis.

A experiência do usuário é fator primordial para criar heavy users. Pessoas amam aquilo que elas conseguem usar sem problemas.

Imagine se uma plataforma sai do ar sempre que alguém está próximo de chegar ao optimum trigger para se tornar um heavy user?

Caixão e vela preta para a sua startup.

O suporte

Para finalizar, suporte.

Dependendo do negócio é mais provável que essa área seja o sucesso do cliente. Mas no final do dia o objetivo é o mesmo: oferecer um serviço de suporte estelar para o usuário.

Perceba que, por suporte, eu não falo apenas de resolver problemas através de tickets abertos em um CRM. Mas também de dar todo o suporte para que os seus clientes tirem o máximo do serviço –antes mesmo de dominarem ele.

De primeira, a maior referência para mim nessa área é o Shopify.

Ele possui blogs em diversas línguas com conteúdos de suporte para quem deseja montar uma loja online. Seja um iniciante, intermediário ou avançado, existe um conteúdo pronto para responder dúvidas.

O Uber, pelo menos no começo, ressarcia cobranças indevidas e respondia reclamações muito rápido. Logo os usuários perceberam que era muito confortável utilizar o serviço mesmo se houvessem adversidades.

Essa não é só uma oportunidade de trabalhar para uma experiência de uso cinco estrelas, mas também de encontrar os gargalos do produto.

Onde os usuários têm problemas? O que é difícil de ser executado? O que é positivo?

O suporte ajuda no desenvolvimento e crescimento da startup. Fica mais fácil escalar o negócio se você souber o que precisa melhorar para conseguir mais clientes.

O seu produto do futuro resolve os problemas dos seus clientes de agora (eu não lembro onde li essa frase, se você souber, me dá um toque nos comentários? ;] ).

Checklist dos unicórnios (será?)

Seria muito arriscado fazer um checklist dos unicórnios. Não vou nem tentar.

Mas é seguro dizer que as características são similares a todos eles. Mercado, formato, preço. Esqueça MVP ou market-fit, essas são etapas que todos vamos enfrentar. Não adianta passar por isso sem ter uma boa fundação para a sua startup.

É muito mais interessante encontrar um mercado que precisa de uma boa ideia, do que uma boa ideia que precisa de um mercado. Ideias valem cents. 😉

Go big or go home!

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